30.5.12

você prefere normal ou especial?

é impossível não ver as manchetes das revistas dispostas estrategicamente para evitar o tédio quando na lenta fila do caixa do supermercado. dessa forma fico sabendo de tudo! superficialmente, é claro. a verdade é que tenho uma enorme preguiça de me "aprofundar" mas acontece que uma delas me chamou a atenção. era Julia Roberts, na capa de uma dessas revistas americanas, emoldurada por letrinhas miúdas que diziam coisas do tipo, "J.R abre o jogo para a revista tal" e depois, "...e nos fala como criar filhos normais"??!!
gente, ela sabe! - pensei ironicamente. dei muitas risadas com os pensamentos que invadiram minha mente naquele momento. queria ser a filha da dita cuja pra ter a honra de saber o que é ser normal. 
 tem chamado minha atenção a forma como se educam as crianças hoje em dia. estou naquela fase que quase todos os amigos já têm filhos e todos são deslumbrados com suas criações. mas percebo uma intensidade diferente. parece que não falam apenas de crianças e as vezes sinto que os pequenos pensam o mesmo! estamos vivendo numa época de uma sociedade voltada para o prazer, para o consumo e muitas possibilidades. numa época onde a responsabilidade pode ser transferida à uma instituição mediante pagamento, nos restando apenas a diversão. tão deslumbrados que estamos com tudo isso acabamos nos esquecendo que crianças, são ainda crianças! tudo aconteceu muito rápido para nós, mas é obvio que seu filho sabe como mexer no iPad. pra ele não é uma novidade diferente de quando vimos o Atari. mas a intensidade da resposta que esperamos deles me espanta. tratamo-os como genios estimulando-os para que cresçam cada vez mais rápido . crianças de 6 anos hoje têm mais horas de escola que seus pais. parece que gostamos de criança quando na verdade projetamos neles nossa ansiedade de ver logo o resultado da criação. meio uma vingança desmedida contra os próprios pais. "vou te mostrar o que é ser um bom pai"!  mas uma criança não pode se sentir especial apenas porque você gasta na melhor escola para um ser de 1 ano, nas festinhas, nas roupinhas, nos brinquedos, no carro que você se preocupou em comprar para ter mais segurança pra ele... no status que essa criança deve manter. ela não quer nada disso! tudo no mundo pra ela é novidade e gostoso desde que esteja com seus pais e que esses a amem. isso é normal para uma criança, todo o resto é especial apenas para o adulto. lembre-se que nossos pais não perderam a oportunidade de nos cobrar todo o investimento. e como vejo que não perdemos o habito de imitar, apenas mudamos os brinquedos, me assusto com o tamanho da responsabilidade dessas crianças.
 com certeza minha mãe não sabia o segredo da J.R e hoje vejo que evoluímos muito nos tratamentos moderninhos de diagnósticos de hiperatividade, ansiedade, insonia e depressão infantis. uma criança tão especial assim nenhum pai quer, não é? 

23.5.12

suicidal tendencies

- ce acha que eu preciso de terapia?
- demorô!
- essa semana quase me joguei da ponte JK.
- faz assim, se a terapia não der certo, eu te empurro!
desde o dia que ouvi esse dialogo tragicômico deu-se inicio uma serie de eventos de mesma natureza, como é comum na minha existência. nesse caso, da natureza do suicídio. ao contrario do que se possa imaginar não foi no consultório, mas acontece que esses eventos em serie me despertam para algo que pode estar acontecendo em vários universos particulares. como é de minha natureza juntar alhos com bugalhos vou tentar descrever aqui a serie de eventos que ocorreram na minha mente maluca, que busca sempre um porque pra tudo.
costumo sempre dizer "o que há de errado com o mediano"? cada um com seu conceito mas confesse, o conceito de uma vida plena não tem nada de mediano. poucos são os que vivem sem a sensação de ser especial e a fantasia de algum dia ser reconhecido por grandes feitos. se não for isso, então não vale a pena viver! mas na minha experiencia percebi que a intensidade que buscamos no futuro é justamente aquela que projetamos no passado. sim, projetada no passado! porque dificilmente podemos nos imaginar grandes e poderosos sem aquelas imagens sofridas de abandono, rejeição, abuso e negligencia do passado. acontece que essas imagens foram intensificadas na época, e o são até hoje, para que não desistíssemos de viver ou, de pelo menos tentar. acontece que quando adultos percebemos que a existência não é tão intensa como nos contos pessoais. daí seguimos reeditando-os, com toda a criatividade que acreditamos não ter, até a exaustão. até que não faça mais sentido. quando o cabra está pronto para desistir, encontra o meio, o mediano, o ordinário, o medíocre. a vida sem a potencia fantástica e principalmente sem a recompensa por anos de sofrimento. esse cabra tem a clareza que o futuro não reserva nada daquilo que imaginava pra si. o cabra não tem escolha se não "desintensificar" seu passado. abrir mão daquela autobiografia de dor que o faz tão especial, e aceitar que é mediano. num processo terapêutico isso se dá no inicio com a imagem dos pais, quando esses são super-poderosos e sagrados. no suicídio o individuo está em contato direto com a própria verdade. entendo então que esse evento o coloca de frente para si mesmo, com aquilo que sempre tentou entender e que nesse momento, faz todo o sentido. é a plenitude em si! então ele pode decidir , viver o alivio de uma existência comum ou abrir mão da oportunidade de escrever uma  nova autobiografia... de escolhas.

15.5.12

a mente não é de confiança

experimente a palavra descanso deixando sua mente trazer as imagens livremente ... deitar na cama no meio da tarde, meditar, depressão, se jogar no sofá na frente do emburrecedor, dormir, academia, paz, bem-sucedido, não pensar em nada, vácuo, vazio, tédio, invalidez, praia, aposentadoria, sexo, vinho, casa-própria, bem-estar, férias, paraíso, virgens. opa, virgens! quem quer ficar no meio de virgens? pois é, a mente prega essas peças. mas tudo isso e muito mais ela é capaz de fazer com uma simples palavra. sua mente, seu carrasco. para cada ação, um conflito de imagens. então para não dar confusão, criamos conceitos que nada mais são que todas as imagens num mesmo arquivo. e cada um tem um conceito diferente sobre tudo sempre baseado nas próprias experiencias. o pensamento gera sensações, as sensações geram o comportamento e esse cria a realidade.
vivemos a semana esperando o conceito final-de-semana e no domingo a noite vem aquela angustia que dá todo o colorido da  próxima semana, acompanhada da trilha sonora do Fantástico. angustia porque quando olhamos pro final de semana percebemos que nele não encontramos nada de especial. não recebemos nenhuma recompensa pelos dia de sofrimento do conceito de trabalho, e por conta disso a próxima semana só pode prometer o mesmo. mas se pensamos que nunca realizamos nada porque então dizemos "não tenho tempo para nada", do que tanto nos ocupamos afinal. percebo que nos ocupamos de ocupar a vida para evitar que o N-A-D-A, a invada. agora experimente o conceito do nada e perceba a angustia que existe nele.
fica parecido com a paz eterna que tanto nos aterroriza. descanso para mim não é o mesmo que para você. da mesma forma que não fazer nada está longe de significar descanso pra mim. quando ouvimos uma necessidade ela se transforma em vontade e só então podemos realizar algo. realizar é uma conquista pessoal e intransferível ! agora experimente o conceito de conquista...eita peste! aposto que sua mente quer conquistar o mundo. é por isso que tanto evitamos os próprios desejos. eles parecem impossíveis! a vida fica cansativa quando feita apenas de conquistas a longo prazo, de mega-conquistas. a vontade é bem mais forte que a mente. faça-a de escrava forçando-a realizar seus desejos. comece do mais simples e não permita que ela subtraia o prazer da realização dizendo que seu desejo é tolo. aproveite e diga que ela é uma chata!

4.5.12

linhas cruzadas

visitei meu próprio blog muitas vezes essa semana intentando escrever, e nada. "as ideias não conjuminavam", como diria o outro. mas uma conversa ao celular daqui, outra no skype dali,  eis que surgiu um cruzamento de linha.
"a cabeça vai bem mas o corpo..." diz ela respondendo àquela velha pergunta de bom-tom que inicia todas as conversas ordinárias, ainda no escritório atormentada por seus relatórios, me mostrando através da câmera uma garrafa de vinho a 1/4 de ser reciclada, tentando me fazer inveja. corta. 

 "eu também estou entediada. agora mesmo estava arrumando briga no facebook" respondeu a outra ao telefone. "passei por uma onda de trabalho tão grande esses últimos dois meses e agora não sei o que fazer"! e completa, "acho que sou workaholic"! confessando-me o que disse, aos prantos, para o terapeuta. corta.

"ta tudo bem, mas acho que estou cansada. estou indo para um evento fora da cidade, hoje tenho um jantar não sei onde com não sei quem, amanhã almoço não sei onde... e domingo tenho que jantar com minha mãe (em outra cidade). acho que estou sentindo saudades da minha casa"? disse a terceira ao telefone. corta.

volta a cena pra essa que vos escreve, que de tudo isso constata, não sabemos descansar! 
me remeteu a mãe suficientemente boa do Winnicott. aquela que percebe que o filho quando irritado, perturbado e agressivo, apenas precisa de descanso. aquele soninho da tarde ou a hora de encerrar o dia, com a garantia amorosa de acordar para um outro. as vezes até a saudade da própria casa, devido a uma eventualidade do mundo adulto. essa mãe nos serve, no inicio, para nomear as sensações e emoções além de direciona-las de forma que essa energia seja poupada para o dia seguinte com a famosa sentença, "agora chega! amanhã você brinca mais".
 todas essas funções são aprendidas, não são inatas como as instintivas. quando crianças entendemos que dormir é perder tudo! 
 para nós hoje, o descanso deve ser merecido. para merece-lo entendemos que devemos passar por grandes períodos de desgaste físico e emocional, ou seja, descansamos apenas num estado de esgotamento. mas percebi outra  coisa dessa conversa entre quatro amigas, que temos algo em comum. hoje não temos exatamente um "problema" mas esse "espaço do descanso não-merecido" pode muito bem ser ocupado por novas questões, descabidas é claro! apenas para preencher. e o "espaço vazio" também é outra angustia que devemos aprender a lidar... mas isso fica pra outra hora. 
vou descansar agora, e o farei muito grata por essas três amigas.
boa noite! a la Cid Moreira